quinta-feira, 11 de junho de 2020

A REVOLUÇÃO DO AUTOCONHECIMENTO E O FILME “...E O VENTO LEVOU”: RACISMO, MÍDIA E MANIFESTAÇÕES



O racismo, de fato, é um tema muito triste de se tratar, pois remete a um outro tema tão triste quanto: nós, os homo sapiens, verdadeiramente, não evoluímos, como até há pouco pensávamos, quando nos vangloriávamos do iluminismo, positivismo, cientificismo, etc.


Talvez por isso que o movimento romântico, dos séculos XVIII e XIX, deveras estava certo, senão pelos meios, onde alguns extremistas somente encontraram saída em vícios, suicídios, derrotismo, etc., mas principalmente pelo resultado, quando, despretensiosamente, mas de forma categórica, acertaram em cheio acerca da derrocada do extremismo racionalista, fato cabalmente escancarado pela ocorrência das grandes guerras mundiais, das crises econômicas, dos holocaustos e apartheids de todo gênero, ainda durante o século XX.


Mas… o século XX não foi suficientemente capaz de destronar o pessimismo na evolução da espécie humana!


Ora, se a evolução se deu no nível biológico, para fins de adaptação da espécie, ante as intempéries do meio ambiente e ameaças à reprodução e sobrevivência, verifica-se, inconteste, que diante da celeuma e manifestações que envolve o tema do racismo nos EUA, a tal pretendida evolução ainda não aconteceu no nível sociológico, particularmente, a meu ver, no que concerne ao autoconhecimento.


Nesse aspecto, ouso afirmar que, não obstante as revoluções cognitivas (há 70 mil anos), agrícola (há 12 mil anos) e científica (há 500 anos), ainda estamos engatinhando na história, e precisamos de uma nova revolução, a revolução do autoconhecimento e da autoestima, pois somente assim poderemos, de fato, aceitar o “diferente” e vencer o preconceito e a discriminação, recepcionando a diferença, não como uma ameaça à própria sobrevivência, mas como um valor agregado.


Em verdade, triste é afirmar que, ante a essa luta por espaços decorrentes da aversão racial, demonstrado está, cabalmente, que ainda estamos no tempo dos neandertais.


Os neandertais da pré-história, considerados desafetos dos sapiens, foram substituídos pelos neandertais de hoje, igualmente alvos de preconceitos,  justamente por serem considerados os "diferentes" de nós, os sapiens, em pleno século XXI. 

Os neandertais de hoje, discriminados por todos os meios, somos todos nós, diante de cada situação específica, de forma sorrateira e discreta, às vezes escancarada, discriminados somos nós de todas as cores, os negros, os brancos, os amarelos, os morenos, os verdes, os vermelhos, os latinos, os orientais, os índios, os nordestinos, os gaúchos, os nortistas, os paraguaios, os argentinos, os bolivianos, os venezuelanos, os judeus, os muçulmanos, os cristãos, os favelados, os pobres, os ricos, os de direita, os de esquerda, as mulheres, os gays e todos os LGBTTs, as crianças, os idosos, os vizinhos, os que pensam diferente, as outras espécies animais, etc. A lista não tem fim, e basta observar para nossa ignóbil autocompreensão e autoconhecimento para, de pronto, eclodir o sentimento de aversão, repúdio e preconceito.


Por quê tanta aversão, repúdio e preconceito contra o diferente? Será por medo? 


Na Bíblia, a imagem que representa a ameaça que causa o medo é a água. Talvez, por causa do medo das pessoas que Jesus andou sobre as águas e proclamou ao mundo: "Não tenhais medo!" (Mt 14, 27) e noutro momento disse: "Eu vim para que tenham vida, e tenham em abundância" (Jo 10,10). Sem medo, sem preconceito; sem preconceito, vida plena!


O fenômeno do preconceito, da discriminação e do racismo é um fenômeno geral? Insisto na esperança de acreditar que não, mas não fecho os olhos para enxergar que a falta de educação, de valores e a existência da liquidez baumanariana assolam e determinam, cada vez mais, as percepções e relações entre as pessoas.


É sabido que por onde o sapiens andou ele andou destruindo tudo o que viu. Talvez essa visão seja pessimista demais, contudo já houve quem, antes de mim, considerasse o ser humano como um vírus1; outros, como Norberto Keppe2, afirmam que o ser humano possui uma atitude destruidora em relação aos entes próximos, a ele mesmo e ao meio ambiente, expressando um sentimento de inveja a tudo o que é naturalmente bom, belo e verdadeiro. Talvez, disso decorram as mais variadas formas de preconceito, que atentam contra a dignidade dos “diferentes”.


A recente matéria, da Revista Veja3, intitulada “… ‘E o vento levou’ é retirado de streeming após campanha antirracista”, denuncia, de forma subliminar, o quanto as pessoas não estão aptas à convivência com o diferente, por vários motivos, dentre os quais destaco o seguinte: a incompetência que se tem de ler os fatos históricos no contexto em que eles aconteceram. Isso vale para todos os eventos históricos, sem exceção: Não se deve interpretar o fato histórico fora do seu contexto!


O racismo aconteceu? Sim, aconteceu como fenômeno histórico e ainda acontece, para a vergonha de todos! 


Temos que aprender com a história para não repeti-la. Isso é óbvio, desde os tempos em que, quando crianças, aprendemos com os nossos pais, no mais das vezes através de palmadas, que determinados atos errados não devem se repetir. Meus pais nem precisavam falar muito, quando bastava o olhar para que entendêssemos que alguma coisa estava errado e que não deveríamos repetir, senão…, já sabíamos! Desde cedo, portanto, nós aprendemos que coisas erradas não se deve repetir. Isso é aprender com a história!


Conforme relata a matéria da citada revista, a fala do diretor da HBO MAX (streeming que disponibiliza a película estreada em 1940), insinua que a compreensão acerca da história, no caso o filme, precisa, veementemente, ser adequada ao contexto próprio!


Entretanto, celeumas à parte, o filme, uma vez contextualizado, é obra-prima da sétima arte, ganhador de várias estatuetas do Oscar e merece ser assistido por todos.


Mas o fato, noticiado pela reportagem, caricatural na performance, revela e levanta a bola do politicamente correto, até na censura da arte. O fato merece, sim, a nossa crítica quanto a questões de ordem política, com “p” bem minúsculo, e interesses que correm paralelamente, notadamente quanto às recentes manifestações antirracistas nos EUA.


Para o bem da verdade, não se pode desprezar acerca do que, como pano de fundo, se pretende nessa dinâmica onda midiática, muito parecido como é tratado, aqui no Brasil, o caso do brutal assassinato da vereadora Marielle.


O que se vê, nesse estardalhaço midiático é de todo uma tentativa, infelizmente, em muitos casos, bem-sucedida, de manipular consciências, em vista a uma possível associação do fato negativo aos governantes, estes com posição ideológica contrária ao interesse dos detentores do 4º poder.


Portanto, muito filtro e senso crítico ao apelo da parafernália midiática! 


Dessa forma, eles, os detentores do 4º poder, matam dois coelhos com uma só cajadada: de um lado as manifestações abarrotadas de pretensos “baluartes defensores das causas justas”, servem de massa de manobra para esquerdistas que visam emplacar uma crise social e política no país, fato que se agrava ainda mais quando se atravessa uma pandemia, levando à opinião pública uma falaciosa associação  do tipo: governo "tal" implica em racismo; governo "tal" implica em ditadura; governo "tal" implica em violação dos direitos humanos; etc.


Por óbvio, o racismo é tão nojento e abjeto como também o é tais interesses escusos, visto que sinaliza para o fato de que ainda vivemos na idade da pedra, quando não aceitamos, seja por covardia, medo, incompetência ou mesmo pela não aceitação de si próprio, aquilo que se nos aparece como “diferente”, para então resolvermos pelo extermínio do outro que não se mostra a nós como espelho, máxime, quando esse espelho reflete uma imagem distorcida ou colorida com tintas partidárias!


Tal recurso é corriqueiramente utilizado como pretexto da exclusão, desde a extinção dos neandertais! No fundo, é tudo disputa pelo poder! 

Que vençam os discriminados e as vítimas do racismo!


Evoluamos, estudemos e brademos: viva ao pensamento livre, sem manipulação!


Para finalizar, aprendamos com Kant: 

A inumanidade que se causa a um outro destrói a humanidade em mim”.


1Disponível em: https://super.abril.com.br/ciencia/o-homem-e-um-virus/, acessado em 11/06/2020.


Nenhum comentário:

Postar um comentário